CURADORIA
Fabrício Reiner e Nina Kreis
Roteiro de Visita Educativa à Exposição
SALA TULA
Durante esta visita daremos uma leve pincelada no universo da História da Arte para perceber o quanto a obra de arte pode ser singular e ao mesmo tempo estar carregada de referências, as quais em grande parte, o artista Marcello Grassmann obteve ao frequentar a Biblioteca Mário de Andrade em sua juventude.
INÍCIO
Aluno de modelagem da escola profissional do Brás, Marcello Grassmann aprende o ofício de entalhe em madeira
Observe nesta peça que a representação de folhas e frutos traz a referência do próprio passado do que um dia foi esta matéria prima, uma árvore. Peça de função decorativa, feita com grande destreza por parte do jovem estudante.
Ao apresentar para seu professor um estudo para entalhe que trazia a imagem de um grifo (figura mitológica de um ser fantástico) seu mestre percebe que seu lugar não era alí. Marcello então parte em busca de um novo caminho.
DA OBSERVAÇÃO DO REAL AO IMAGINÁRIO FANTÁSTICO
Desenhos de observação
O FANTÁSTICO
Ressignificar o real trazendo novas reflexões ao observador sobre o mundo que nos cerca.
O domínio de anatomias diversas adquirido com os desenhos de observação leva o artista a realizar composições de seres híbridos (parte humano parte animal), os seres fantásticos de Marcello povoarão sua produção durante toda a sua vida.
O hibridismo no trabalho de Grassmann acontecia não só em relação às formas mas também as características técnicas dos estilos que o artista absorvia, como expressionismo, renascimento, etc.
MADEIRA, METAL E PEDRA
XILOGRAVURA
A habilidade do jovem entalhador com a madeira, leva Marcello Grassmann à arte da xilogravura.
A madeira é utilizada como matriz, onde abrindo sulcos em seus veios o artista faz emergir, entres luzes e sombras, seus seres imaginários, possibilitando assim, como um carimbo, a reprodução de muitas estampas do mesmo desenho.
A xilogravura, técnica milenar, tem seus limites determinados pela própria matéria-prima, a madeira. A técnica da xilogravura já não oferece mais a qualidade gráfica que Marcello busca em suas imagens, parte daí então para a litografia e gravura em metal que lhe permitem outras nuances e sutilezas.
LITOGRAVURA
Marcello Grassmann recebe uma bolsa de estudos e vai para Viena onde frequenta o ateliê (.......) e realiza trabalhos em litogravura.
A técnica da litogravura consiste na utilização de uma matriz de pedra onde é possível desenhar livremente com um lápis gorduroso. Ao aplicar a tinta sobre a pedra, esta adere somente ao desenho que é então impresso sobre o papel com a utilização de uma prensa.
Observe na litogravura exposta que é possível perceber a textura da porosidade da pedra presente na qualidade gráfica produzida, característica dessa técnica.
GRAVURA EM METAL (CALCOGRAVURA)
Sobre a placa de metal é possível criar, com pontas secas por exemplo, desenhos com maior fluidez, sfumatto e degradês de claros e escuros através da corrosão com ácidos, possibilidades infinitas de fazer e desfazer até alcançar resultados de imagens muito ricas em detalhes.
Marcello Grassmann encontra na gravura em metal a linguagem artística que o acompanharia em sua trajetória até seus últimos trabalhos.
ÚLTIMO DESENHO E CADERNO DE DESENHOS REALIZADOS
SALA 3º ANDAR
A BIBLIOTECA
O jovem Marcello foi frequentador assíduo da Biblioteca Mário de Andrade de 1943 a 1950. Durante este período teve contato com diversos artistas e poetas modernistas, dentre eles Mário de Andrade, que foi incentivador de seu trabalho e chegou a adquirir algumas de suas produções da época. Nas dependências da biblioteca, por intermédio de Sergio Milliet e Maria Eugênia, teve contato mais amiúde com o acervo de livros raros da seção de arte. Veremos a seguir algumas publicações que fazem parte desse acervo, as quais possivelmente foram folheadas por ele e que certamente o influenciaram profundamente.
LIVROS
“Mestre do fantástico e do visionário, herdeiro de artistas góticos, sua obra é povoada de guerreiros, dragões, anjos e demônios.”
HISTÓRIA DA ARTE
E.H. Gombrich
“Seus esboços e estudos mostraram ser também seu propósito contemplar a beleza da natureza e copiá-la. Alguns desses estudos de Durer ficaram famosos, como a sua lebre.”
HISTÓRIA DA ARTE
E.H. Gombrich
Albrecht Dürer │ 1471-1528
Albrecht Durer │ A Morte, o Cavaleiro e o Diabo │Calcogravura │ 1513
“A mesma paciência que o capacitou a desenhar os esboços, na imitação da natureza, também fez dele o gravador nato que nunca se cansou de juntar detalhes sobre detalhes a fim de construir um verdadeiro microcosmo no âmbito de sua lâmina de cobre.”
HISTÓRIA DA ARTE - E.H. Gombrich
Hieronymus Bosch │ 1450 - 1516
“Bosch ficou famoso por suas aterradoras representações das forças do mal.”
HISTÓRIA DA ARTE - E.H. Gombrich
“No tríptico Jardim das Delícias, o painel da direita representa a visão do Inferno. Amontoam-se horrores sobre horrores, fogo e tormentos, e toda espécie de pavorosos demônios, meio animais, meio humanos ou meio máquinas, que flagelam e castigam por toda a eternidade as pobres almas pecadoras”
HISTÓRIA DA ARTE - E.H. Gombrich
Alfred Kubin │ 1877 - 1959
Artista austro-húngaro Kubin é um representante do expressionismo e do simbolismo. Dedicou-se ao desenho e as artes gráficas onde cria imagens com temáticas entre o macabro e o fantástico. Foi ilustrador de escritores como Edgar Alan Poe e Dostoievski
Alfred Kubin │ Adoração │Desenho │ 1900
William Blake │ 1757 - 1827
"Poeta e místico inglês, era um homem profundamente religioso, que vivia num mundo de sua própria criação. Alguns pensavam que ele era completamente louco; outros davam-no como um excêntrico inofensivo e só meia dúzia de seus contemporâneos acreditavam em sua arte e o salvavam de morrer de fome. Vivia de fazer gravuras, às vezes para os outros, outras vezes para ilustrar seus próprios poemas."
HISTÓRIA DA ARTE - E.H. Gombrich
William Blake │ O ancião dos dias │Calcogravura com aquarela │ 1794
A figura representa uma das ilustrações de Blake para seu poema Europe, a Prophecy. Diz-se que Blake tinha visto essa figura enigmática de um ancião agachado para medir o globo com um compasso, numa visão que pairou acima de sua cabeça no topo de uma escada, quando ele vivia em Lambeth.
Oswaldo Goeldi │ 1895 - 1961
Gravador, desenhista, ilustrador e professor. Expôs na XXV Bienal de Veneza em 1950 e ganhou o prêmio de gravura na 1ª Bienal Internacional de São Paulo em 1951. Sua xilogravura é referência no campo da gravura no Brasil e no mundo.
Aplicando técnicas como a xilogravura o artista alcança expressividade sombria com temas mórbidos em seus desenhos.
Marcello Grassmann teve contato direto com Oswaldo Goeldi, partilhavam interesses artísticos e pessoais.
Oswaldo Goeldi │ Céu Vermelho │Xilogravura em cores │ 1950
REFERÊNCIAS TÉCNICAS EM GRAVURA
Livro ilustrado em gravura em metal e texto em tipografia de 1745
MONOTIPIAS
As monotipias são umas das poucas obras que chamamos de "estudos". Marcello não era de fazer esboços antes de ir para a matriz. No final do dia de ateliê, ele aproveitava a tinta de impressão que sobrou aberta na mesa de entintagem para produzir as monotipias. Estas posteriormente serviriam como referências para criação de gravuras, como podemos ver no exemplo abaixo:
ÁLBUNS
Somente na Biblioteca Mário de Andrade é possível ver a série completa de xilogravuras produzidas por Marcello Grassmann durante o período em que viveu na cidade de Sorocaba.
XILOS DE TOPO
As xilogravuras realizadas nos seis álbuns expostos, foram realizadas com “matrizes de topo”. As matrizes na xilogravura podem ser feitas em placas de madeira cortadas no sentido do veio (verticalmente) e também cortadas no sentido do topo (horizontalmente). Com isso, os desenhos realizados terão as características do próprio sentido da madeira. A xilo de topo permite a movimentação das goivas (facas de cortes específicas para essa técnica) em direções diferentes das de matriz de veio.
ALFA E OMEGA
Essa imagem ao compõe o álbum que teve como inspiração a fábula grotesca escrita pelo também pintor Edvard Munch.
Além das referências da história da arte Marcello buscava inspiração em outras mídias como músicas, histórias em quadrinhos e em filmes como Cat People, de 1942, que inspirou a série abaixo
LIVROS DOS AFETOS
Simultaneamente à abertura dessa exposição aconteceu o lançamento do Livro dos Afetos, a primeira publicação do Núcleo de Estudos Marcello Grassmann que traz referências do que existe no acervo como fonte de pesquisas sobre a história da gravura.
O livro contém três relatos afetuosos sobre o trabalho de Marcello: Leon Kossovitch e Denis Bruza Molino, que mantiveram contato pessoal com o artista, e Ana Godoy que se aproximou do trabalho de Marcello através de conversas com Zizi Baptista, idealizadora e fundadora do Núcleo. Três diferentes visões do que esse acervo representa na história do artista e referências posteriores a todos que possam se interessar pela história das artes gráficas e do desenho no Brasil e no mundo.
Este conteúdo foi elaborado por Marili Serafini, arte educadora do Núcleo de Estudos Marcello Grassmann.